Carlos Alberto Lopes

segunda-feira, junho 25

SOLIDARIEDADE

Havia mais de quarenta horas que aquele homem estava sentado ali naquele mesmo local, no corredor do Pronto Socorro Municipal, segurando um chapéu surrado entre as mãos, cabisbaixo, cabelos já grisalhos, paletó pedindo um ferro de passar, sapatos implorando uma graxa de há muito...
Vez por outra, levantava os olhos, procurando alguém... Fazia já quarenta horas que agia assim... Não dizia uma palavra... Não se movia dali...
O local onde estava, era em frente à Unidade de Terapia Intensiva. Há quase quatro dias, trouxera para aquele Pronto Socorro, um menino sem nome... Sem história... Sem nada...
Não era seu parente... Nem sequer o conhecia...
Quarenta horas atrás, viajava o idoso pela estrada de chão batido, indo para casa, após um longo dia de trabalho.De repente, aparecendo não se sabe de onde, surgiu em frente a seu veículo, aquele pequeno garoto, e embora o automóvel não estivesse a muita velocidade, o atropelamento, foi inevitável!
Quarenta minutos depois, tanto o menino quanto o idoso, davam entrada no Pronto Socorro Central!
Após avaliação do Corpo Clínico de plantão, o menino foi internado na UTI, com suspeita de múltiplas fratura, inclusive um traumatismo craniano.
O menino entrou na UTI...
O velho, sentou-se na cadeira...
Quarenta horas...
Dois mil e quatrocentos minutos...
Ali, frente à Unidade de Terapia Intensiva, aquele senhor, olhava para as próprias mãos... sem saber direito o que fazer!
Era a primeira vez que lhe acontecia algo assim... Sentia-se impotente... Solitário... Parceiro somente de seus sentimentos.
Por várias vezes, nas últimas quarenta horas, voltara seu pensamento ao passado, quando ainda tinha uma esposa, dois filhos... uma família!
A esposa, morrera na virada dos anos setenta, vítima de câncer... Os filhos mudaram-se para longe, após casarem-se, e já faziam uns bons dez anos, que não lhe davam notícias...
Acostumara-se a ser só...
Calado...
Pensativo...
Há mais de vinte anos era dono de um pedaço de terra, fora dos limites da cidade...
Ali construíra um pequeno rancho, onde passava as noites...
Pela manhã, dirigia-se aos Correios, onde era o responsável pelo Posto, há mais tempo do que podia lembrar...
Agora estava ali, sem saber o que fazer...
Em certo momento, dirigiu-se ao idoso uma das enfermeiras, trazendo às mãos uma folha de papel...
Era o Boletim!
O garoto teve traumatismo craniano e, em consequência deste, veio a falecer...
O idoso levantou os olhos, olhou para a enfermeira, levantou-se da cadeira que estava sentado, há mais de quarenta horas, e saiu do Pronto Socorro...
Ninguém mais o viu...
Na manhã seguinte, o Posto dos Correios não abriu...
Ficou fechado durante uma semana...
Ao final da tarde do sétimo dia, um desconhecido encontrou um corpo, dentro de um Ford 29, parado à beira da estrada que levava à parte rural do município...
Era o velho funcionário dos Correios e Telégrafos...
O médico legista constatou:
_"Enfarto do Miocárdio!"

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