Carlos Alberto Lopes

quinta-feira, junho 28

MACHADO

O morro do pepino já havia passado por muitas situações, e a comunidade já acostumara-se a encontrar corpos sem vida, em terrenos vazios.
Já estavam acostumados a enfrentar o medo de balas perdidas, quando a policia resolvia trabalhar um pouco, e invadia o barraco do Machado, procurando dar a voz de prisão ao coitado, só por causa de seu meio de sobrevivência: vender um pó branco, parecendo talco, para uns bacanas que, vez ou outra, subiam o morro.
A policia não gostava do Machado, mas ele era querido e respeitado no morro do pepino, pois não havia sido o Machado que conseguiu o dinheiro para enterrar dona Gestrudes, que resolveu morrer logo na hora que o filho, desempregado, estava sem nenhum no bolso?
Foi o Machado quem providenciou tudo, e não esqueceu nem da pinga e o café para o velório.
Foi ele também quem ajudou Maria Dorotéia, quando o marido dela, pai de dez filhos, fugiu com a loira falsa da Clara Maria, deixando a pobre da Dorotéia sem nenhum para cuidar dos filhos.
Machado, ao saber da situação, deu ordem ao Onofre, dono do armazém, para que não faltasse nada na dispensa de Dorotéia. Teve uma conversinha ao “pé do ouvido” com o dono do barraco, onde vivia a família, e nunca mais Dorotéia teve que pagar aluguel.
É certo que se comenta que o Machado, vez ou outra, dorme no barraco de Dorotéia, mas é apenas um boato sem fundamento, obra de quem não tem o que fazer.
Machado é querido por todos1
Nasceu, ali no morro mesmo, na casa do velho Machadão, que tinha já cinco filhos, quando sua mulher pariu Machado.
Quando o menino tinha lá seus doze anos, Machadão teve um enfarte, ao ver a mulher aos beijos e abraços com um tal de Olavo.
Machadão foi desta pra melhor, deixando seis filhos órfãos .
A mãe, ficou sem amante também, pois o pequeno Machado, dois dias depois da morte do pai, pegou o tal do Olavo distraído, numa das subidas do morro, e abriu-lhe a cabeça, com o machado de cortar lenha.
A mulher, ao ver o amante morto, enlouqueceu, sendo internada e vindo a falecer, anos depois.
O pequeno Machado não quis ir, como os irmãos, para a casa de parentes e a comunidade do morro o adotou. Passou a viver na casa do seu Amarildo; na casa do Nicanor ou na pensão de dona Euclastia.
Quando Machado estava com seus quinze anos, Nicanor foi morto por um PM bêbado.
Machado sumiu, após o enterro do amigo, e só reapareceu dois meses depois.
O morro ficou sabendo, por comentários, que Machado mandou o PM bêbado pra “cidade dos pés juntos”, em frente ao batalhão da PM, e o fez com o revolver do defunto.
Daquele dia em diante, Machado não teve mais sossego, pois vez por outra a Policia Militar sobe o morro, tentando colocar-lhe as mãos.
A comunidade, ao seu modo, o protege como pode, e Machado retribui a proteção, pois no morro do pepino não há roubo.
O ultimo morador do morro que foi roubado, foi o Zé Padeiro, que teve um encontro desagradável com um delinqüente armado, na subida do morro, perdendo no ato o relógio e a carteira, com a féria da padaria.
Machado ficou sabendo do caso pela boca da vitima, e ficou vermelho que nem pimentão maduro:
Vinte e quatro horas depois, batia Machado à porta de Zé Padeiro. Trazia, em uma das mãos, o relógio e a féria roubada.
Na outra mão, Machado trazia um presente ao amigo: as orelhas do delinqüente!
Isso aconteceu a uns três anos atras.
De lá pra ca, o morro do pepino é lugar seguro, tanto que os barracos dormem de janelas abertas e os pais de família tem a certeza que o pouco que têm não lhes será roubado, pois Machado e à lei no morro do pepino.
Machado também pensa nos pequenos, e arrumou terreno, onde levantou uma creche, com lugar para mais de cinqüenta crianças, que lá ficam, enquanto as mães trabalham fora.
A capela de padre Justino, em um vendaval, perdeu o telhado.
Machado, três dias depois, já estava na igreja, dando inicio as obras de reforma da cobertura e pintura da capela sem custo algum nem para a igreja, muito menos para a comunidade.
Padre Justino em agradecimento, mandou fazer uma placa de madeira entalhada e a colocou ao lado direito do altar, próximo à porta da sacristia, onde se lê!

“Com Machado no morro do pepino, governo não é necessário e a policia, só atrapalha”

A placa ainda esta lá, pra quem quiser confirmar.

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