Carlos Alberto Lopes

domingo, junho 24

DONA DURVALINA

Aquele senhor, já estava sentado no banco da praça, quando Dona Durvalina passou por lá, às seis e meia da manhã, para ir enfeitar o altar de São Loureço, por causa da graça que alcançara, quando pedira ao bom Santo, para fazer com que seu marido criasse juízo e parasse de beber, pois a recomendação do médico fôra taxativa: "ou parava, ou ia ser a principal atração de um velório... o seu".
A velha senhora não estava com disposição para ser chamada de viúva, e espalhara aos quatro ventos: "ou o Santo dá seu jeito, ou o velho toma vergonha. O que não quero é enterrar-me em vestimentas de luto fechado, por um porqueira, que nunca valeu coisa alguma!"
Segundo Dona Durvalina dizia, o Santo fez o milagre, e ela pagava seu quinhão da promessa, com fervor e gratidão, pois não era mulher de dever nada a ninguém, principalmente a São Lourenço, que devia ter um prestigio dos diabos, pois conseguirá fazer o velho desistir da cachaça, coisa que nenhum ser humano conseguira, por isso todos os dias, às seis e meia da manhã, atravessava ela a praça, e entrava pela porta lateral da Igreja, indo enfeitar o altar do Santo, chovesse canivete ou tivesse um sol de lascar.
Aquele senhor, com terno de casimira quadriculada e camisa branca de mangas compridas com colarinho alto, calça azul-marinho, meio desbotada pela ação das lavadas constantes, meias brancas, sapatos pretos impecavelmente sujos de lama, gravata de seda, com motivos florais e um pequeno chapéu de feltro, com uma pena azul-turquesa do lado esquerdo, que caía-lhe sobre os olhos, estava sentado no mesmo lugar, quando Dona Durvalina voltou da Igreja, às nove da manhã, logo após a missa.
Ao meio dia, Dona Durvalina atravessou novamente a praça, pois lembrara-se que tinha de buscar massa de tomate para o macarrão, prato que resolvera preparar naquele domingo, e seu Alencar, Dono da Mercearia, arreava as portas de seu estabelecimento as doze horas e quinze minutos, pontual como o Big-Bem, só voltando às suas atividades comerciais na segunda feira.
Quando passou pela praça, tanto na ida como na volta do mercadinho, Dona Durvalina avistou o mesmo senhor, no mesmo lugar, com as mesmas vestimentas.
Eram treze e trinta, quando Dona Durvalina colocou, ao centro da mesa, a bela travessa de porcelana chinesa, com a sua já famosa macarronada, e chamou os filhos: três meninas, já gastando pequena fortuna na caderneta da farmácia de Seu Valdomiro, em absorventes íntimos, que usavam como se fossem rolos de papel higiênico; um menino de doze anos, que vivia perseguindo as meninas do Colégio Municipal, onde há quatro anos não alcançava nota para sair do primeiro ano do primário, e o mais velho, que completaria vinte e um anos no próximo sábado, com missa encomendada ao Monsenhor Nonato, que já cedera o Salão Paroquial para os festejos, já encomendados ao Buffet de Marcolina, a mesma que fizera a festança do filho do Senhor Prefeito, da qual Dona Durvalina gostara tanto...
Com o almoço à mesa, e os garotos todos sentados, Dona Durvalina, após servir um a um, também sentou-se...
Foi aí que lembrou-se:
_"Cadê o Mané?!
Foi uma correria!...
A casa foi revirada de ponta a cabeça, e nada...
Quando os garotos já estavam se cansando da procura e reclamavam que a macarronada esfriara, D. Durvalina, teve um "estalo" de memória...
_"Augusto! - falou ao filho de doze anos - Corre na praça e avisa teu pai que o almoço está na mesa. Ele esta lá, sentado no banco, esquentando o chapéu de feltro!"

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