Carlos Alberto Lopes

sexta-feira, junho 22

O PARTO

O vento noroeste se fez presente com a fúria costumeira, fazendo a copa das árvores centenárias da praça da matriz vergarem e os pequenos animais procurarem abrigo.
Foi no meio do noroeste, que Maria de Fátima resolveu, sem mais aquela, avisar o Felisberto que seu primeiro filho tava dando seus primeiros sinais de vida e que, se não corresse, ela o colocaria no mundo ali mesmo.
Felisberto se apavorou.
_Como pode ser isso? Já esta na hora?
Maria de Fátima não respondeu, apenas se colocou na posição mais confortável possível, enquanto Felisberto saiu que nem um desesperado, em busca de um local para o inevitável parto, que já estava a caminho.
Em poucos minutos, tia Maricota, parteira de renome, estava
ao lado de Maria de Fátima, para ajuda-la no momento certo.
O noroeste, por sua vez, ganhava mais força e mais violência, fazendo as flores do jardim central da praça, perderam suas pétalas, e o cata-vento, que estava no alto do coreto, de tanto rodar, acabou despencando, caindo no pequeno lago artificial, existente bem em frente ao busto de Teodoro da Fonseca, patrono da cidade.
A igreja, com a força dos ventos, perdeu meia dúzia de telhas, que acabaram caindo no terreno de dona Juvelina, que em dia de noroeste não saia de casa, passando todo tempo rezando diante da imagem de Santa Bárbara.
Seguindo os passos do noroeste, veio a chuva fina, que encharcou a terra esturricada do canteiro das rosas de dona Ercilia, que era professora primária a tanto tempo que escrevia farmácia, usando “PH”.
Maria de Fátima estava em trabalho de parto e o Felisberto desesperado, corria de um lado para outro, tentando encontrar um local seguro para o nascer de seu rebento.
A chuva e o vento continuavam fortes e persistentes, tanto que a companhia de força e luz, achou melhor cortar a luz da cidade, para evitar acidentes.
Sem luz, para mover o maquinário, à usina São João parou a produção, acompanhada por todas as industrias da cidade.
A padaria Lisboa , como tinha forno à lenha, não parou, mas o proprietário mandou acender meia dúzia de lampiões à querosene, para iluminar a padaria e poder atender os fregueses.
Enquanto isso, Maria de Fátima continuava em trabalho de parto, e Felisberto continuava que nem doido, buscando um lugar seguro.
Eram mais ou menos três da tarde, quando um pedaço de telha, caído não se sabe de onde, atingiu a cabeça do menino Lindolfo, filho de Hernestina, e fez Acácio abrir a farmácia, que fechara com medo do vento, e dar oito pontos na cabeça do moleque.
Filomeno, o senhor de mais idade da cidade, com certidão de nascimento escrita a mão e com o brasão do império, que já estava no museu da cidade doada pela família, começou a passar mal lá pelas quatro da tarde e , pelas seis, estava morto
O Dr. Edgar, chamado para atende-lo, diagnosticou que Filomeno morrera de velhice, nada mais que isso.
De uma hora para outra, como tinha começando, o noroeste e a chuva sumiram, dando a um lugar a um lindo entardecer.
Felisberto viu nascer seu rebento quando o noroeste foi embora.
Maria de Fátima e Felisberto ficaram felizes como nunca, pois nascera seu herdeiro, na copa mais alta da jaqueira da praça.
Era um lindo curió, como o pai, só que trazia umas penas de cor indefinidas, como a mãe.

autor: Carlos alberto Lopes
emal: escritor@uol.com.br

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